Se o povo é religioso, não deixa porém de ser muito supersticioso, herança atávica de seus antepassados e passada de geração em geração.

Apontemos algumas das suas superstições e crendices que ao longo dos tempos se ouvem na nossa terra.

As bruxas

Segundo os crentes, são mulheres que por pacto feito com o diabo se tornam seres sobrenaturais e dotadas de grandes poderes.

Fazem arrelias aos pobres ignorantes que nelas acreditam, para isto ou contra isto têm remédios considerados infalíveis que aprenderam desde pequenos. Se trejugam os bois que vão apostos ao carro (se saem fora do jugo). Deita-se a fralda da camisa de fora das calças e benze-se com ela em cruz os animais aflitos, voltando logo a canga ou jugo ao seu lugar.

Se sentir o efeito de um mau olhado quando se encontra uma mulher com fama de bruxa, esfrega-se a testa com um alho íngrime (alho que não tem gomos ou dentes) e fica-se como dantes.

Deus deixou os males no mundo, mas também deixou os remédios, é crença geral e arreigada entre o nosso povo. Segundo as crenças populares, faz-se uma figa, reza-se uma oração adequada e tudo desaparece como por encanto.

O Diabo e as Almas Penadas

 Conta a Bíblia que o diabo uma vez se metera nos porcos de uma grande vara e os afogava em um lago ou rio. Segundo as crenças populares, hoje em dia, nas nossas aldeias, o diabo não se aloja nos porcos para se incubar; aloja-se de preferência nos corpos de certas raparigas ou rapazes histéricos, para neles fazer as suas diabruras. Para este mal há também remédio… é o exorcismo.

Lobisomens ou Corredores

Se do mesmo casal nascer uma série de sete filhos do sexo masculino e o mais velho não for padrinho do mais novo, ou a este faltar algumas palavras no baptismo, está sujeito a correr o fado.

É uma coisa bem triste correr o fado!

O condenado sai de casa sorrateiramente em certas noites, despe-se, deita-se no sítio onde se espojou algum animal e , tomando a forma deste, corre, corre por esses caminhos e campos até ao romper do dia. Então volta ao mesmo sítio, deita-se outra vez, recupera a forma humana, veste-se e recolhe sossegadamente a casa, a dormir o sono da manhã.

É um martírio obscuro para o pobre condenado!

Há um remédio infalível para terminar este fadário mas, dizem, muito perigoso para quem o aplica: é picar com uma aguilhoada o corredor. Se lhe acertar, este retoma a forma humana para jamais a perder ; se não lhe acerta, uma grande desgraça, que não sei qual seja, mas deve ser terrível no dizer desta gente.

Moiras Encantadas e Tesouros Escondidos

Há quem diga que tenha visto as moiras encantadas, umas em figuras de cobras com grandes tranças de cabelo na cabeça, de lagartos, etc. e outras até em figura humana.

Guardam as tristes os tesouros que os da sua raça deixaram escondidos e encantados quando da sua expulsão pelos cristãos.

O melhor guia para encontrar esses tesouros e desencantar as moiras, é o livro de S. Cipriano.

Há por aí muitos sítios (fala-se na citânia do Facho) onde os tesouros estão escondidos, uns em forma de ouro e pedras preciosas e outros em forma de cacos, bichos, etc., segundo a imaginação de cada um.

Diga o leitor ao povo crente que isto não é verdade, que o menos que lhe pode acontecer é … rir-se da sua ignorância !

Ar Ruim

É frequente apanhar-se um ar ruim. Dormir descoberto, permanecer diante de uma porta ou janela aberta quando tocam às Ave Marias, etc, recebe-se um ar ruim e pode-se ficar tolhido para o resto da vida.

O remédio empregado para este mal é talhá-lo, o que qualquer feiticeiro ou mulher de virtude faz.

Videntismo

Segundo testemunhos de pessoas ainda vivas, nos anos 50, no lugar de Quiraz, desenrolou-se uma história de falso videntismo ou falsa aparição sobrenatural.

Segundo algumas pessoas que passavam nesse local, sentia-se um aroma um pouco estranho. O povo, fértil de imaginação, criou a lenda de que nesse local existia algo de sobrenatural, os mais crédulos diziam que era local de aparições.

Certo dia, um senhor de Alvito S. Pedro, um tal Fonseca, trouxe da Correlhã, uma menina que se dizia ser vidente e que tinha presenciado casos de aparição.

A notícia correu a freguesia e o povo de freguesias vizinhas.

Nesse dia, juntou-se nesse local uma grande multidão, alguns abandonaram os trabalhos e outros nem foram trabalhar, na expectativa de verem algo de extraordinário. Houveram pessoas que estiveram no local todo o dia, algumas estiveram empoleiradas nas árvores desde a manhã até ao fim da noite.

Como nada de extraordinário ocorria, alguns foram perdendo a paciência e crença, os mais persistentes saíram desiludidos abandonando o local a altas horas da noite e soltando alguns desabafos – estive aqui todo o dia sem comer, em cima de uma árvore e vou-me embora sem ver nada.

Caça do piupardo ou toutinegra

Levavam alguns pacóvios para um sítio ermo, de noite, onde os deixavam com um saco aberto junto à boca de uma mina, cujo objectivo era caçar um animal de pele muito rara ou penas de muito valor . Os que se deixam ir nestes contos sustentam a abóbada destas crenças populares.

O desgraçado fica ali toda a noite enquanto os outros vão gritando por longe para, dizem, espantar a caça e se recolhem a casa, rindo da ingenuidade do logrado.

Todas estas histórias se têm passado ao longo de várias gerações.

Em 1990 aconteceu uma história deveras hilariante que ilustra bem estes costumes, tratou-se de uma caça à toutinegra, que se diz ser uma ave rara cujas penas faz qualquer pacóvio milionário, aconteceu no mês de agosto em que dois pacóvios da terra ( não são identificados para não ferir susceptibilidades ) cegos de ganância, caíram no conto e fizeram rir todos os que assistiram.

Recentemente um ou outro pacóvio caiu no conto dos perus holandeses.

Conclui-se que basta mudar o nome do animal, de preferência um nome invulgar, para que os pacóvios caiam nestas histórias.

Mas são estes simples ingénuos que sustentam e perpetuam estas crenças populares.

Os usos e costumes ou as tradições são parte importante na identidade e da cultura de um povo. Ao longo dos tempos, certas tradições mantiveram-se inalteráveis, outras sofreram influências e algumas simplesmente só existem na memória do povo.

Das Memórias do Passado

Trabalhar cantando é a melhor suavização da pena a que foi condenado o homem.

Certas actividades eram verdadeiras festas, autênticas manifestações culturais, podendo ser considerados autênticos “Serões de Província”.

Estes serões, autenticas manifestações de cultura, ao longo dos anos foram regredindo e praticamente não se realizam.

Hoje, apenas algumas Associações Culturais realizam estes eventos de forma a recordar e manter viva esta tradição.

As Cegadas

A ceifa do centeio, do trigo e a da erva para forragem eram feitas muitas vezes de rogo (os vizinhos faziam-na por favor aceitando apenas comida e bebida) e algumas até em dias santificados. Durante a ceifa, homens e mulheres cantavam canções tradicionais.

O cereal cegado era atado em molhos, estes eram colocados uns sobre os outros formando a silhueta de um boneco.

No final da tarefa era usual cantar-se e dançar-se.

 As Sachadas de Milho

O milho sacha-se duas vezes: decrua e arrenda. Quando o trabalho apertava era usual fazerem-se sachadas de rogo.

Os trabalhadores exercitavam as gargantas, cantando temas populares, e exercitavam a língua, falando sobre a vida do dia a dia, falando das coisas mais triviais, até da vida alheia.

 As Desfolhadas

Quando o milho atingia o seu estado de maturação era cortado e transportado para as eiras e estava pronto a ser desfolhado.

As desfolhadas eram feitas geralmente à noite. Os lavradores contactavam um certo número de pessoas, geralmente os vizinhos, de acordo com a quantidade de milho que havia para esfolhar. Usualmente as pessoas faziam o serviço sem qualquer remuneração pecuniária, por favor, aceitando apenas comida e bebida.

Durante a desfolhada as pessoas cantavam canções tradicionais, havendo despiques entre vários grupos.

Um dos melhores divertimentos era o aparecimento da espiga rainha, espiga de milho vermelho, dando direito ao felizardo que a encontrar, de abraçar todos os circunstantes.

Apareciam, na desfolhada, pessoas mascaradas que ao chegarem cumprimentavam todos os presentes e com as suas brincadeiras entretinham as pessoas.

No final da desfolhada serviam-se aos presentes diversas iguarias e vinho. Depois cantava-se e dançava-se ao som de concertinas, violas e harmónicos. Os homens escolhiam o seu par e entravam na dança.

Os moços solteiros aproveitavam estes serões para fazerem a corte ás raparigas que mais lhes agradavam.

 As Malhadas ou Malhas

A malhada do centeio e trigo é um serviço violento, feito em dias de muito sol e calor.

Os malhadores são escolhidos entre os homens mais possantes e robustos da vizinhança, os quais empregam a força que podem, puxando pelos malhos e manifestam a sua alegria e satisfação dando afoitos uníssonos

No final do trabalho servem-se aos malhadores diversas iguarias e vinho. Enquanto comem e bebem, as raparigas da casa vão esconder entre a palha da eira o ramo, que é um ramo de flores acompanhado de pão trigo, chouriço ou doce, destinado ao primeiro malhador que o encontrar.

 O Linho

Até meados deste século, muitas famílias rurais de Entre-Douro e Minho produziam o seu próprio tecido de linho para satisfazer grande parte das suas necessidades em vestuário e em peças brancas para uso doméstico. Por isso, lá dizia o ditado:

Gente do Minho veste pano de linho…

Os trabalhos do linho, desde a sementeira da linhaça até ao acabamento do bragal, decorriam num ciclo demorado que ia de 12 meses a 18 meses, aqui e ali marcado por rituais mais intensos como eram os casos do “arreigar o linho”, das espadeladas e das fiadas.

Perdeu-se já grande parte dos pormenores como cantares, ditados, brincadeiras, mas o essencial daquelas tradições ainda permanece gravado na memória das pessoas mais antigas.